Esses são os relatos da nossa querida companheira e doula Helena, mãe do Luís Gustavo e da Carolina. Uma cesárea desnecessária e um parto normal após cesárea(PNAC) alguns anos depois.
NASCIMENTO
DOS MEUS FILHOS, MEU PARTO E SUAS LIÇÕES
Estamos em 2010, três anos
após meu VBAC, e sinto necessidade de escrever um novo relato, com uma reflexão
maior. Vai ser longo porque vou contar a história toda...
Tudo
começou quando engravidei pela primeira vez, em 2001. Eu e o Guilherme éramos
namorados, eu tinha ovários policísticos e fiz tratamento com homeopatia, que
se mostrou muito bem sucedido! Não foi planejado, mas hoje sei que foi
inconscientemente desejado. Eu estava grávida e não queria admitir nem para mim
mesma. Só fui descobrir com 12 semanas, em uma ecografia para investigar por
que eu não estava menstruando, rsrsrs...
Eu
queria parto normal porque achava que era assim que os bebês nasciam, ainda não
sabia da realidade obstétrica do nosso país. Minha mãe ficava preocupada porque
teve dois partos cheios de intervenções, sofreu bastante e eu e meu marido
somos grandes, então ela dizia: “vai com calma, vamos ver o tamanho desse bebê
primeiro...”. Instintivamente, eu achava que não tinha nada disso, que ele
nasceria normalmente e pronto. Eu lia sobre parto, treinava respiração, fazia
hidroginástica, mas não encontrei a informação que precisava para conseguir
parir.
Minha
médica era cesarista. Nunca atrasava ou desmarcava uma consulta, consultório
cheio de mães recentes para tirar os pontos, consultas rápidas. Perguntou se eu
queria normal ou cesárea e não fez nenhum comentário quando eu disse: normal.
Mas com 31 semanas, ele estava sentado e ela já sentenciou: vai ter que ser
cesárea. Confesso que me senti até aliviada, na verdade tinha muito medo do
parto.
Acho
que o fato dele estar pélvico não era suficiente, pois ainda poderia virar (eu
é que não sabia), então quando completei 33 semanas ela disse que o bebê não
estava crescendo como deveria e pediu uma ecografia com Doppler para verificar
a circulação entre a placenta e o Luiz Gustavo. Eu quase surtei. Fiquei
realmente preocupada que algo estivesse errado e talvez isso até tenha
contribuído para que eu entrasse em trabalho de parto prematuro com 34 semanas.
Foi
super engraçado. A família toda reunida na pizzaria, meus pais, sogros, irmãos
e cunhados, numa comemoração. Eu comecei a sentir umas cólicas, fui ao
banheiro, não passou, percebi que eram regulares, voltei para a mesa e,
disfarçadamente, pedi para o Guilherme marcar o tempo. Eu falava: agora. Depois
dizia: agora. E ele respondia: sete minutos. Depois seis. E cinco. A coisa
estava evoluindo rápido. A médica já tinha feito terrorismo sobre ele começar a
nascer de bumbum e ter algum problema. Saí para ligar para a médica e o
Guilherme ficou na mesa explicando o que estava acontecendo. Ela disse para eu
ir rápido para o hospital que a GO de plantão ia me atender, que ainda não
estava na hora de nascer.
Chegando
lá foi feito um toque: 2,5 cm
de dilatação. A médica me colocou no soro com o medicamento para inibir o
trabalho de parto e disse que se as contrações não parassem em não sei quanto
tempo, não iria segurar. Aplicaram corticóide para “amadurecer” os pulmões
dele.
Fiquei
lá a noite toda e mais dois dias, as contrações pararam, fui para casa, ficar
de repouso absoluto, tomando Brycanil, deitada o tempo inteiro, me movimentando
com cuidado para não romper a bolsa. Fiquei quatro semanas de repouso. Toda
sexta ia à médica, meu único passeio... Na quarta quinta-feira tive algumas
contrações à noite e, chegando ao consultório na sexta pela manhã estava com 5 cm de dilatação. Aí a médica
virou para mim, bem calma: já pode ir direto daqui para o hospital que logo eu
chego lá para fazer a cesárea. Eu estava com a minha mãe, ligamos para o meu
pai e o Guilherme, pedimos para eles levarem as malinhas e nos encontrarem lá.
No
hospital rasparam meus pelos com gilete e me levaram para o centro cirúrgico. O
Guilherme também entrou, toda a família esperando do lado de fora. Amarram meus
braços, judiaram para colocar o soro (a menina estava aprendendo, ui!), tomei
anestesia, senti o sangue sair quando a médica fez o corte. Senti que estava
difícil tirar o Luiz Gustavo porque o bumbum escorregava, ela não conseguia
segurar firme, eu sentia os puxões. O anestesista colocou as mãos na minha
cabeça, me acalmou, fez um carinho (o Guilherme estava deslocado, só
observando, não sabia o que fazer). Aí senti puxar forte, disseram que não era
dor, mas para mim era sim! Falei um “Ai!” bem forte e ele nasceu! Não ouvi ele
chorar, levaram embora, mas logo trouxeram, embrulhado, colocaram do lado do
meu rosto e eu pensei: tão branquinho... será que era ele mesmo que estava ali dentro
da minha barriga? Para mim não existia conexão entre a minha barriga grávida e
aquele bebê ali. Ficou um “?”, como diz aquela comunidade do Orkut. O médico
falou: “beijinho no nenê” e eu dei um beijinho, aí levaram para o berçário. Eu
fiquei ali, sendo costurada, santa paciência, como demora...
Depois
de muito tempo levaram meu filhote para o quarto, meus pais e sogros disseram
que ele ficou com os olhinhos abertos, olhando para eles pelo vidro do
berçário. Eu estava acabada. Destruída. Parecia que um caminhão tinha me
atropelado. A amamentação foi um suplício. Não tinha bico no meu peito, as
enfermeiras ameaçavam que ele teria que ficar nos hospital, tomando soro se não
mamasse. Deram uma seringa cortada para eu puxar o bico do seio, o que só fez machucar.
O calor estava insuportável, as visitas iam e vinham em comitiva, eu não tinha
um momento de privacidade para amamentar meu bebê! Depois de não sei quanto
tempo, talvez só no dia seguinte, o colostro saiu e ele começou a sugar.
Não
tive reações desagradáveis à anestesia, mas não conseguia fazer xixi. Tiveram
que colocar sonda três vezes. Foi um suplício. Quando cheguei em casa estava
muito cansada e as visitas continuavam. A pele onde os pelos foram raspados
ficou super irritada, coçava, ardia, o desconforto foi terrível.
A
amamentação acabou sendo um sucesso, ele mamava dia e noite de duas em duas
horas, meia hora em cada peito. Cresceu e engordou assustadoramente rápido. No
começo os bicos do seio racharam, tive mastite, tratei só com homeopatia, sarou
e amamentei até ele completar um ano. O vínculo entre nós era algo mágico, eu
estava apaixonada pelo meu filho e ele por mim :o)
Quando
resolvemos engravidar pela segunda vez, no final de 2005, eu fiz exames com a
minha médica (a mesma), parei com a pílula e ficamos usando camisinha por uns
dois meses. Eu não me lembro se engravidei primeiro ou se ainda não estava
grávida quando fui procurar uma comunidade sobre o assunto no Orkut. Acabei
encontrando a “gravidez, parto e maternidade”, da Drika, doula. Eu nunca tinha
ouvido falar em nada daquilo. Descobri amigas do parto, parto do princípio,
devorava os relatos, era aquilo que eu queria prá mim! Um parto natural, sem
intervenções, um nascimento suave para o meu bebê. Pensei: preciso achar um
médico que me assista, a que eu tenho decididamente não serve. Comecei a
procurar e descobri apenas uma médica, Rose Fischer, que atendia parto
domiciliar, mas não aceitava plano de saúde. Quando falei com o Guilherme que
queria parir em casa, com a médica particular, ele vetou na hora. Achou absurdo
pagarmos plano de saúde e termos que desembolsar um valor daqueles, ficou
aterrorizado com a ideia de um parto domiciliar (ele tinha muito medo que eu
morresse no parto, mas só fui descobrir mais tarde). Eu, que não estava tão
segura da minha ideia, desisti fácil.
Fiquei
desesperada tentando achar um médico do plano, do jeito que eu queria. Acho que
foi aí que a Vanessa Rosa criou a comunidade “grávidas de Curitiba” no Orkut e
eu fiquei sabendo de uma mulher que tinha acabado de parir com o Carlos Miner
Navarro, que atendia meu plano. Ufa, eu estava salva! Marquei a consulta,
conversamos muito, gostei dele, mas cometi um grande erro: achei que tudo já
estava resolvido. Perguntei sobre doulas, ele só conhecia a Juracy Ayres, já
trabalhava com ela. A Felicitas tinha feito o curso, mas estava trabalhando
muito e não garantiu sua presença no dia do parto (ainda bem, porque ela acabou
parindo quinze dias antes de mim!). Marquei entrevista com a doula Juracy,
gostei dela, ela foi fundamental na “conversão” do Guilherme, fizemos um
encontro com molde da barriga em gesso, ela mostrou o vídeo do parto da Naolí e
um outro, ele adorou.
Combinei
com a doula que ela iria numa consulta comigo, para combinarmos os detalhes do
parto com o médico, mais no final da gravidez. Eu marquei uma consulta com o
pediatra da maternidade para tentar negociar os protocolos de atendimento ao
recém-nascido com ele. Só que todos nós descuidamos de um detalhe que não
devíamos ter desprezado: na primeira gravidez eu tinha entrado em TP com 34
semanas, por causas desconhecidas. E dessa vez não foi muito diferente.
Eu
tinha deixado tudo para a última hora, não tirei fotos, não fiz plano de parto
(só para a Carolina, escrevi as coisas que não queria que fizessem com ela).
Era sábado, eu estava completando 35 semanas e a consulta com o pediatra seria
na quarta. Acho que a doula iria comigo no GO na mesma semana. Fiz meu chá de
bebê e não parei um minuto. Só no final do dia percebi como estava cansada, não
tinha sentado, minha barriga pesava. Eu já estava pensando em começar a licença
logo, não aguentava mais trabalhar, queria curtir um pouco a barriga, me poupar
mais...
No
domingo de manhã fomos ao parque, Guilherme acompanhando Luiz Gustavo na
bicicleta, eu andando devagar, atrás deles. Cansei demais, precisei sentar e
esperá-los. À tarde, sentei na poltrona do quartinho dela e fiz uma lista de
tudo que ainda faltava fazer! Aí comecei a sentir umas cólicas. Achei que
fossem gases, não queria nem pensar em outra possibilidade...
Fomos
ao MacDonalds lanchar, já era noite, eu estava animada, ignorei um pouco o que
estava sentindo. Estávamos lá e eu percebi que os gases estavam ritmados,
rsrsrs... Contei no meu relógio: 10 em 10 minutos. Eram 21h00. Comentei com o Guilherme,
fomos para casa e eu já vendo que o intervalo estava diminuindo. Chegando lá
liguei para o Carlos que orientou a tomar Buscopam e ficar deitada. Se não
passasse, ir para a maternidade ser examinada pelo GO de plantão. Pensei: não,
por favor, de novo não!
Fiz o que ele falou e de nada adiantou. As
contrações continuavam. Fui ao banheiro, esvaziei o intestino e lembrei que
isso também era sinal de TP. Olhei no espelho e vi que minha barriga estava bem
mais baixa!
Chegamos
à maternidade à 01h30 da manhã. O médico me examinou: 3 cm de dilatação. Ligou para
o Carlos e comentou do TP de parto inibido na primeira gravidez, acharam que
valia a pena tentar. Era tudo que eu não queria, já imaginei ficar mais quatro
semanas deitada.
A
enfermeira já queria raspar meus pelos, foi levantando a camisola e perguntando
se eu estava depilada! Eu falei que meu médico não exigia e ela não insistiu.
Ficamos
no corredor esperando o internamento. As contrações ficaram mais doloridas,
lembro de ter pensado que da primeira vez não cheguei a sentir isso, a coisa
estava apertando, falei para o Gui que se demorasse muito ela ia nascer...
Fui para o mesmo quarto
que eu tinha visitado. Fiquei feliz porque o parto ia ser no quarto e, se
tivesse que nascer naquele dia, seria ali onde eu imaginei.
Fiquei naquele soro
horrível, tendo falta de ar e taquicardia até de madrugada. Deitada de lado,
conversando com a Carolina que não era hora de nascer, que se acalmasse. E as
contrações bem fortinhas... Em um certo momento parou porque eu dormi. De manhã
a enfermeira veio perguntar e eu disse que tinha passado, não estava mais
sentindo nada.
Mas de repente comecei a
sentir. Uma contração. Meia hora depois, outra. Mais meia hora e outra. O
Carlos chegou às 11h00 para me examinar e eu tive uma contração bem na hora.
Ele disse: “não precisa nem falar, acabou de ter uma, né?”. Ele fez o toque, olhou
calmo para nós (eu e minha mãe, o Gui tinha passado a noite lá e saído cedo
para o trabalho): “é, não deu certo, está com 7 cm de dilatação, vai nascer
hoje”.
Levei um grande susto.
Como assim, vai nascer? Eu estava totalmente comprometida com a missão de não
deixá-la nascer! Fiquei lá deitada sem saber o que fazer. Liguei para o Gui:
“volta, vai nascer!” e para a Juracy: “venha rápido, já estou com 7 cm !”.
O médico falou que íamos
esperar a dilatação total para ir para o centro obstétrico. Eu perguntei: “ué,
mas não dá para ser no quarto?”. Ele respondeu que não, que a maternidade
estava lotada, não tinha ninguém para ajudá-lo no quarto, a Carolina poderia
precisar de algum atendimento imediato, lá já estaria perto da UTI...
Fiquei arrasada. Pensei
pronto, tudo está perdido. Não vai ser nada do jeito que eu queria. Fiquei lá
deitada, ele foi procurar uma sala para mim no CO (as cesarianas agendadas
ocupavam todos os horários).
Era mais ou menos meio dia
quando fomos para o CO. O Gui tinha chegado e a doula ainda não. Eu não queria
minha mãe no parto, sabia que ela iria ficar com pena de mim e atrapalhar, ela
ficou no quarto nos esperando.
Quando entrei naquele
centro cirúrgico, com aquela camisola de hospital fechada na frente e aberta
atrás, vi aquela maca estreita, as paredes azulejadas, tudo tão frio... quase
chorei. Entrou uma enfermeira e falou que já ia chamar o anestesista. Aí eu
respondi que não ia tomar anestesia. Ela quase caiu para trás, disse: “Mas vai
ter filho assim, sem nada?”. Fiquei pensando se eu era tão louca assim, se a
dor seria mesmo insuportável. Foi quando a doula chegou, animada, me levou para
andar, buscou um copo de água para mim, tudo clareou, me senti mais relaxada,
mais à vontade.
Fiquei por lá caminhando,
gemendo, me apoiando na Juracy, na maca, quando vinha contração. O Carlos
perguntou se eu já estava sentindo a Carolina mais baixa e eu respondi que não
sabia. Ele pediu para deitar, escutar o coraçãozinho dela, eu deitei e comecei
a sentir vontade de fazer força. A partir daí o bicho pegou, foi uma atrás da
outra e fazer força era tão gostoso! Ele sugeriu que eu virasse de lado, alguém
ficou segurando minha perna para cima. Num dado momento achei que precisava
abrir mais as pernas e deitei de barriga para cima. Ficou o Gui de um lado,
segurando uma perna dobrada para trás e do outro lado a Juracy, fazendo a mesma
coisa. Eu fazia força e as contrações estavam punk, como uma cólica muito forte que durava um tempão. Era como se
uma mão gigante apertasse minha barriga.
Tinha uma menina
auxiliando, ela não sabia o que fazer. Estava desesperada, tentava ajudar de
qualquer jeito. Desligou o ar condicionado porque estava gelado. Ficou me
abanando porque estava calor. Teve uma hora em que ela perguntou se eu queria
que ligasse o ar de novo, só respondi que não, estava na partolândia, sorte
dela que não conseguia falar mais, senão a teria xingado..
O Carlos perguntou se
podia furar a bolsa, explicou que estava atrapalhando a evolução e mostrou um
palito comprido. Eu disse tudo bem e ele estourou, foi um grande alívio, como
se tirasse uma pressão.
A Juracy falou que já
estava vendo o cabelinho, ficou toda emocionada, achei que ela ia nascer
rápido. Eu fazia muita força e nada, comecei a ficar aflita, o que estava
errado, por que ela não nascia. Nunca tinha chamado o Carlos de doutor e
comecei a dizer: “Doutor, doutor, por que ela não nasce?”. O Guilherme me olhou
nos olhos e disse: “calma, está tudo bem, você está indo muito bem”. Um
verdadeiro doulo! Acreditei nele e me acalmei.
O Carlos disse que ela não
estava passando por baixo do osso e perguntou se podia usar o vácuo-extrator,
eu concordei. Da primeira vez escapou, esguichou sangue. Da segunda vez deu
certo e a cabecinha passou por debaixo do meu osso.
Eu queria descer dali, me
deu um desespero, mas todo mundo foi contra, não me deixaram. O Carlos disse
que ia precisar fazer episiotomia, que estava tudo esticado demais, eu
respondi: “fazer o que, se é necessário faça”.
Aí ele colocou um pano na
minha barriga, disse que era para eu pegar debaixo dos bracinhos dela e puxar
prá mim, cobrindo e enxugando com o pano.
Senti que se eu não
parasse de tentar controlar ela não ia nascer (como um orgasmo que, se a gente
não se solta, não se entrega, não acontece). Pensei: seja o que Deus quiser, aconteça
o que tiver que acontecer lá embaixo!
Dei um grito do fundo da
garganta e ela nasceu! Senti o círculo de fogo, depois um alívio imenso, muito
gostoso. Quando os bracinhos saíram, segurei por baixo dos ombros e a puxei.
Olhei prá ela, tão linda: minha filha! Era só isso que eu conseguia pensar:
minha filha! Eu estava eufórica. Por mim levantava na hora e saía com elas nos
braços.
O Carlos clampeou o cordão
e o Gui cortou, o pediatra da UTI estava na sala e levaram ela. O Gui foi
junto, acompanhar os procedimentos (argh!). Ela nasceu ótima, estava prontinha.
Só sabemos que estava mesmo prematura por causa dos sinais (orelhinhas moles,
falta de marca dos mamilos...).
Fiquei lá levando pontos
(cinco, de acordo com o médico). Depois ficamos eu e a Juracy em uma mini sala
com mais duas mulheres que tinham feito cesárea e estava lá tremendo horrores
por causa da anestesia (elas pareciam realmente mal, doentes e sozinhas – foi o
que pensei na hora, graças a Deus que não sou eu!). A Juracy até deu um apoio
prá elas. Eu não entendia por que tinha que ficar lá, em observação, eu estava
ótima, animada, querendo pegar logo a Carolina.
Fui para o quarto e pouco
tempo depois trouxeram ela, vermelhinha de tanto esfregarem, toda enroladinha.
Mamou bem logo de cara, eu estava muito feliz.
O parto foi uma
experiência maravilhosa. Doeu? Bastante. Logo depois eu tinha minhas dúvidas se
gostaria de experimentar aquilo de novo. Depois esqueci. Não me lembro
exatamente de como era essa dor. A natureza é mágica. Eu teria dez filhos de
parto normal sem anestesia.
As coisas não saíram como
eu desejava, acho que diversos fatores contribuíram, mas um foi fundamental: eu
não assumi o parto como meu. Não ocupei meu lugar de protagonista. Entreguei
nas mãos do médico, fiquei na posição de paciente, não fiz meu plano de parto,
não acertei os detalhes com ele e a doula, superestimei o tempo que faltava
para o nascimento. Não fiz valer qualquer uma das minhas vontades, a não ser
não tomar anestesia, que é o meu ponto de honra.
Eu pari minha filha e isso
não tem preço. Fui eu que a trouxe ao mundo. Fui a primeira a pegá-la no colo,
sujinha, sentir seu cheirinho. Embriaguei-me dos hormônios do parto. Foi
intenso, emocionante, poderoso.
Pena que existiram
intervenções que eu acredito que não teriam sido necessárias se eu pudesse ter
levantado, escolhido minhas posições. Tudo começou com a inibição. Penso que
teria sido melhor deixá-la vir, quem sabe de madrugada, aí a maternidade
estaria vazia e a liberdade seria maior. Acho que até minha postura seria
diferente, fazendo tudo para ajudá-la a nascer, ao invés de segurar. Depois foi
o ambiente hostil do CO. A restrição de posição que acabou acontecendo por tão
pouco (até tinha um banquinho baixo lá por perto, a Juracy comentou que
poderíamos ter usado), até um pano no chão servia! As intervenções foram
ocorrendo em cascata como sabemos que acontece rotineiramente. Ficaram cicatrizes. Muito maiores que a da
episio. Tive que digerir tudo que não foi bom no meu parto e só estou chegando
ao fim do processo agora. Tive uma longa fase de tristeza, de culpa, do “se”.
Culpei os outros, culpei a mim mesma, senti como se fosse uma perda. Mas hoje
sei que o “se” não existe. È importante entender e perdoar. Perdoar-se. Aceitar
não significa se conformar, eu queria diferente. Mas tudo que acontece tem uma
razão de ser, oferece uma lição, um aprendizado necessário. As mulheres estão
em diferentes fases do processo de descobrir-se, de entrar em contato com seu
feminino, com seu poder. Acho que eu até consegui bastante. Pelos meus medos,
minhas travas, minhas inibições. Hoje sou mais confiante, mais segura, mais
mulher. Tenho certeza que daria conta do parto dos meus sonhos. Infelizmente
não pretendo ter outro filho, por isso estou aqui, participando do movimento
pelo parto humanizado, querendo ser doula, ajudar outras mulheres a descobrirem
seu caminho. Assim eu curo as minhas feridas. Assim quem sabe eu faça diferença
nesse mundo de superficialidade, de não me toques, de não quero sentir nada.
Espero que logo toda mulher possa escolher, de forma consciente e esclarecida,
como quer que seu filho venha ao mundo. E que não faltem pessoas para dar
assistência nessa jornada.